Aperfeiçoamento do medicamento que trata a esquistossomose é feito por pesquisadores do ITP

18/01/2019

Em oito anos, de 2008 a 2016, o Ministério da Saúde (MS) registrou a morte de 4.473 pessoas no Brasil em decorrência da esquistossomose, conhecida popularmente como “xistose”, “barriga d’água” ou “doença dos caramujos”. Doença infecciosa parasitária que pode gerar graves problemas de saúde crônicos ou até mesmo a morte, ainda é prevalente em todo mundo, principalmente em áreas tropicais e subtropicais, em comunidades carentes sem acesso a água potável e sem saneamento básico adequado, como informa o MS. No mesmo período citado, 425.231 pessoas foram diagnosticadas com a doença e, deste total, 363.857 receberam tratamento, sendo que 2.275 dos infectados necessitaram de internação hospitalar.

Em Sergipe, nos últimos dez anos, ou seja, de 2008 a 2018, foram registrados 49.780 casos positivos da doença, com a morte de 226 pessoas vítimas das complicações causadas pelo Schistosoma mansoni, de acordo com os dados registrados no Sistema de Mortalidade (SIM). Somente em 2018, segundo a Diretoria da Vigilância em Saúde da SES houve notificação de 2.698 casos, destes, 936 foram tratados e 17 pessoas faleceram em decorrência da doença.

Dos 75 municípios sergipanos, 58 são considerados endêmicos (com riscos contínuos de contaminação) para a esquistossomose, como informou Mércia Simone Feitosa de Souza, diretora de Vigilância em Saúde/SES. Segundo ela, os registros desta patologia no Estado têm se mantido estáveis ao longo dos anos, com uma positividade em áreas endêmicas entre 6,68% e 10,98%. Por exemplo, no ano passado, dos 24.571 exames registrados no SISPCE, houve positividade para 2.698, o que corresponde a 10,98% do total das investigações.

Levantamento dos casos positivos de Schistossomose mansoni por Unidade da Federação, feito pelo Ministério da Saúde no período de 2008 a 2016, coloca Sergipe na 4ª posição do ranking Nordeste em número de casos, com um total de 41.461 registros. O primeiro colocado é o estado de Alagoas, com 107.002 registros, seguido por Pernambuco, 65.035. Logo depois vem a Bahia, com 45.335 casos. A quinta posição ficou com o Maranhão, tendo registrado 29.103 pessoas infectadas; a sexta colocação foi da Paraíba, com 19.480 ocorrências. O Rio Grande do Norte, com 9.444 registros ficou em 7° colocado; o Ceará em 8°, com 810 casos e, por último, o Piauí, embora seja importante ressaltar que, nos campos referentes a este Estado, há informações apenas nos anos de 2008 e 2010.

MEDICAMENTO PODE SER MELHORADO

Apesar dos números, a Organização Mundial da Saúde avalia que o Brasil foi um dos locais em que o controle da doença foi implementado com sucesso nos últimos 40 anos, e um dos motivos é o tratamento, fornecido 100% pelo Sistema Único de Saúde (SUS), portanto, gratuito, e realizado com o medicamento preconizado pelo Ministério da Saúde, o Praziquantel, cuja apresentação é em comprimidos de 600mg. A orientação é que seja administrado no paciente, preferencialmente, por via oral. Por ser uma dosagem alta é raro o paciente não apresentar os efeitos colaterais descritos, que são, predominantemente, diarreia e dor abdominal, o que, para crianças acima de dois anos de idade (quando o uso do medicamento é indicado) acaba sendo muito doloroso. O gosto ruim que a medicação deixa na boca também é outro incômodo para os pequenos.

Baseada nos relatos de especialistas e de pacientes, a pesquisadora do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP), Dra. Patrícia Severino, que é farmacêutica e desenvolve pesquisas com nanotecnologia e nanomedicina decidiu que encontraria uma maneira de tornar o combate à esquistossomose ainda mais eficaz, melhorando a forma de apresentação e a maneira de absorção das propriedades do Praziquantel. Após três anos de pesquisa (de 2014 a 2017), cujos estudos e ensaios foram realizados com financiamento do CNPq, e que tinham como objetivo a produção eficaz e de qualidade de formulação farmacêutica do Praziquantel (PZQ) para uso pediátrico no tratamento da esquistossomose e outras helmintíases, a pesquisadora obteve como resultado duas novas formulações da substância. A pesquisa visou, ainda, aumentar a biodisponibilidade do PZQ para promover a liberação modificada e poder ser administrada em menor dose para a obtenção dos efeitos terapêuticos desejados.

OS RESULTADOS

A primeira formulação foi uma dispersão sólida associada a um polímero; e a segunda, um encapsulado com Nanopartícula Lipídica Sólida, escolhida por ser mais estável em meio biológico e produzida com lipídios biocompatíveis, biodegradáveis e de baixo custo. As duas formulações podem ser comercializadas tanto no formato já tradicional, em comprimido, quanto em solução em pó, cuja ingestão seria mais viável para as crianças. “Após os diversos testes conseguimos o mesmo efeito que é alcançado com a versão tradicional, só que com uma dosagem muito menor. Com isso, reduzem-se os efeitos colaterais e também o tempo-resposta do tratamento. O fato de estar polimerizado também faz com que não haja perda da substância à medida em que ela ‘caminha’ pelo trato gástrico, pois será dispersada com maior precisão no intestino, onde o problema está”, comentou a Dra. Patrícia Severino.

As descobertas da pesquisadora do ITP também apresentam como vantagem sobre a forma tradicional do medicamento o fato de ter o sabor ruim mascarado, o que facilitará a adesão ao tratamento, nos casos pediátricos. Todos os testes in vitro já foram realizados e os resultados foram positivos no combate ao Schistosoma mansoni, como afirmou a Dra. Patrícia Severino. Segundo ela, tudo o que foi obtido como resposta após os três anos de pesquisa está registrado nas duas patentes depositadas no Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) e divulgado, até o momento, em um artigo para a comunidade científica nacional e internacional através do Journal of Drug Delivery Science and Technology. O segundo artigo sobre o tema está em construção.

“Está tudo pronto para que uma nova fase seja iniciada, ou seja para que a indústria farmacêutica possa se interessar pelo produto e dar andamento ao processo, que inclui fazer os testes in vivo, aprovação da nova versão do medicamento e produção em larga escala”, comentou a pesquisadora. Para ela, todo o tempo dedicado ao melhoramento do medicamento foi necessário, uma vez que a esquistossomose é um dos mais graves problemas de saúde pública existentes no país devido à magnitude da prevalência associada à severidade das formas clínicas e de evolução da doença.  

SOBRE A DOENÇA

Ciclo da esquistossomose - imagem Fundação CECIERJ

Levantamentos do Ministério da Saúde estimam que, no país, 1,5 milhão de pessoas vivam em áreas com risco de contrair a esquistossomose, que está presente de forma endêmica nos estados de Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. Existem, também, focos de transmissão no Pará, Ceará, Piauí, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Goiás e Rio Grande do Sul. Segundo a Organização Mundial de Saúde, a doença afeta quase 240 milhões de pessoas no mundo e mais de 700 milhões vivem em áreas endêmicas. Apesar de possuir baixa letalidade, as principais causas de óbito por esquistossomose estão relacionadas às formas clínicas graves.

O contágio do indivíduo sadio acontece quando ele entra em contato com água doce onde há a presença de caramujos infectados, hospedeiros intermediários do parasita. Quando chegam à fase de cercaria os Schistosoma mansoni deixam os caramujos e voltam para as águas dos rios e lagos, e é nesta fase que realizam a infecção. Uma vez dentro do organismo humano as cercarias passam a viver nas veias de drenagem do trato urinário, dos intestinos e fígado. Não há contágio direto entre um homem doente e um sadio, ou autoinfecção, entretanto, o ciclo de transmissão da doença é alimentado sempre que o indivíduo infectado deposita fezes (com ovos do parasito) próximo ou dentro de rios e lagos.

O tempo para que os primeiros sintomas da doença apareçam, dentre eles febre, dor de cabeça, calafrio, falta de apetite, diarreia e dor muscular varia entre duas e seis semanas. Quando o paciente passa a apresentar o quadro mais grave da esquistossomose os sintomas são o emagrecimento, fraqueza acentuada e o aumento do volume abdominal, a famosa barriga d’água. Dentre as complicações possíveis que a doença pode causar estão a fibrose da bexiga e do ureter, danos renais, problemas de fígado e até mesmo a morte.

Como o MS alerta, não há faixa etária ou grupo de risco para o contágio, porém, existem fatores de risco da doença, e dentre eles estão: não ter água potável e morar em comunidades onde falta saneamento básico; residir em comunidades rurais, especialmente as populações agrícolas e de pesca, e não fazer a higiene de forma adequada. Entre as parasitoses que afetam o homem a esquistossomose é uma das mais disseminadas no mundo e, de acordo com a Organização Mundial de Saúde está entre as doenças que mais preocupam as entidades que atuam em saúde pública pela importância e repercussão socioeconômica que possui.



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