Em novembro de 2017, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Centro Internacional de Pesquisa Agrícola em Zonas Secas (Icarda) lançaram o folheto “Ecologia, cultivo e usos do Nopal”, nome mexicano de uma antiga conhecida do sertanejo brasileiro, a palma, com o objetivo de divulgar conhecimentos sobre manejo eficaz e informações atualizadas sobre os recursos genéticos da planta, a que tipo de solo ela melhor se adapta e a vulnerabilidade a pragas. A publicação queria estimular o que muitos brasileiros do Nordeste já fazem: usá-la na alimentação, não apenas do gado, mas também da família, como ocorre em alguns municípios do interior da Bahia, a exemplo de Lençóis.
Porém, a Opuntia Ficus-indica, nome científico da conhecida palma forrageira, tem em seu fruto propriedades que vão muito além das questões alimentares, podendo ser importante elemento no combate ao câncer de colo do útero e de mama, em decorrência dos bioativos que possui. E comprovar esta e outras capacidades de uma planta que é fácil de ser encontrada no semiárido e sertão sergipanos é um dos objetivos da pesquisa intitulada “Purificação de bioativos da palma forrageira (Opuntia fícus-indica) utilizando sistemas aquosos bifásicos para aplicações contra o câncer”, desenvolvida no Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP).
A pesquisa conta com o financiamento do Banco do Nordeste do Brasil através do Fundo de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Escritório Técnico de Estudos Econômicos (Fundeci/Etene), e está sendo coordenada pelo Dr. Ranyere Lucena de Souza, pesquisador do Laboratório de Pesquisa em Alimentos (LPA). No fruto da palma forrageira são encontradas importantes biomoléculas, dentre elas as betalaínas, polifenóis e carotenoides, associadas a propriedades antioxidantes. Essas substâncias atendem a necessidades de setores importantes da economia, a exemplo das indústrias de cosméticos, farmacêuticas e alimentícia.
“Nossa pesquisa tem como objetivo geral extrair betanina do fruto da palma forrageira utilizando um método de extração integrado à purificação, utilizando sistemas aquosos bifásicos. Estamos analisando, dentre outros aspectos, as variáveis que podem otimizar o processo de purificação, o que permitirá maximizar a capacidade deste bioativo”, explicou o Dr. Ranyere Lucena.
Mais de 80% do projeto já está concluído. Testes in vitro já foram realizados com uma ótima perspectiva desempenho, portanto, as análises estão cada vez mais próximas à fase de testes com relação à atividade antitumoral em vivo, que serão realizados dentro de uma plataforma muito segura. O pesquisador do ITP explicou, ainda, que mesmo a betanina sendo reconhecida na literatura como excelente no combate ao câncer de mama e de útero, nada impede que ela tenha, também, ótimo desempenho para outros tipos da patologia. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA) o Brasil deverá registrar 625 mil novos casos de casos de câncer para cada ano do triênio 2020/2022.
Dr. Ranyere Lucena afirma, ainda, que os estudos desenvolvidos pelo grupo são pioneiros no Nordeste no que dizem respeito à purificação do composto usando os processos aquosos bifásicos, cuja vantagem do método é ter a presença da água e, por isso, considerado biocompatível e também de baixo custo, o que ajuda a controlar parâmetros importantes do processo, pois, a betanina é muito sensível à luminosidade e à presença de compostos contaminantes.
“O processo de separação utilizando Sistemas Aquosos Bifásicos foi uma importante estratégia para a purificação da betanina, a partir do fruto da palma forrageira, que pode tornar este bioproduto viável e com grande potencial de aceitação pelo setor industrial”, observou o pesquisador. “Purificação de bioativos da palma forrageira (Opuntia fícus-indica) utilizando sistemas aquosos bifásicos para aplicações contra o câncer” já tem dado frutos, como o artigo publicado em revista Qualis A1, e trabalhos publicados em congressos nacionais e internacionais, dentre eles o Simpósio Nacional de Bioprocessos (SINAFERM); o Simpósio Ibero-Americano sobre Sistemas Aquosos Bifásicos (SISAB) e a Conferência Internacional de Biotecnologia Industrial (IBIC), realizada na 2018, na Itália.
TRABALHO EM PARCERIA
O desenvolvimento da pesquisa também conta com a parceria dos doutores Ricardo Luiz Cavalcanti de Albuquerque Júnior, pesquisador do Laboratório de Morfologia e Patologia Experimental (LMPE/ITP); Luiz Fernando Romanholo, do Laboratório de Tratamento de Resíduos e Efluentes (LTRE/ITP); e Álvaro Silva Lima e Cleide Mara Faria Soares, também do LPA/ITP. A pesquisa também contribuiu para a formação de alunos de Iniciação Científica; gerou uma dissertação de mestrado feita pelo aluno Ricardo Porto, da área de Engenharia de Processos; e segue como proposta de tese de doutorado para a sequência de investigações.